A partir dessa postagem, começo a relatar a minha vivência com as sincronicidades.
Fui com um querido amigo à Urca, no Rio de Janeiro, subir pelo mato até o Pão de Açúcar em um sábado à tarde. Chegamos lá às 15h e em 30 minutos estávamos lá no alto, na parte lateral da pedra do Morro da Urca. Aí o amigo me perguntou: “Você quer dar banana para os micos?” Claro, eu respondi. Peguei uma bananinha e logo apareceu um deles, que ficava olhando para mim, me encarava, segurando a banana com as 2 garrinhas e dava uma mordida, me encarava e dava outra. Depois entramos no mato de novo para alcançar o outro lado do Pão de Açúcar, em direção ao bondinho.
Ao chegar lá em cima, no Morro da Urca, lembrei de um sonho recente, que mais do que um sonho era na verdade uma lembrança perdida no tempo. Explico: na época do meu pré-vestibular (hoje, o Enem) por volta de 1981, estive no mesmo local, no Bondinho do Pão de Açúcar para assistir a um show, em uma arena de espetáculos e dancei bastante, sozinho, feliz. Era a época da new wave. Estava vestido em 1981 com uma roupa, talvez, rosa com uma gravata verde, algo assim, Isso ocorreu um pouco antes de eu ter a minha primeira banda. O curioso é que eu nunca dancei na frente dos outros, por ter vergonha, por me achar ridículo, essas coisas que incutem na sua cabeça e você acredita…Lembro desse momento, porque só devo ter dançado na frente dos outros, umas 3 vezes em toda a minha vida e essa foi uma delas.
Após relembrar o sonho, perguntei ao amigo onde poderia ser a tal arena dos shows. Ele apontou na hora para o local, fomos até lá e havia uma corrente na frente impedindo a entrada. Lógico que entramos e estava tudo escuro lá dentro, apagado. Passamos pela cortina cerrada e fui até o mesmo local da plateia onde eu me lembro de ter dançado e lá estacionei, 29 anos depois. Fechei os olhos, conjurei com o meu coração, que eu desejava retornar até aquele ponto da minha vida, mas com a cabeça de hoje, retornar a um estado mais puro da vida, sem traumas, sem vergonhas, sem julgamentos, um período pré anos 80, pré-dores, pré-tudo e que aquele momento fosse como um ritual particular para uma grande mudança de vida.
Alguém tentou entrar no local enquanto estávamos lá e o amigo impediu, falando algo como “Não pode entrar, é proibido”. Assim que saímos da escuridão, tive um outro insight curioso: quando estive em Portugal em 1996, terra dos pais do meu pai, andava muito pela cidade, para conhecer as ruas, como faço no Rio. Em Lisboa, subi um morro em um bairro velho e lá em cima havia uma igreja. Lembro que na época, a primeira impressão que tive é que a localização da igreja parecia a mesma da arena de shows no Morro da Urca, além do que fisicamente, e do alto, ambas as cidades se assemelhavam. No mesmo local da arena dos shows na Urca no Rio, na mesma posição, havia uma igreja com cúpula arredondada em Portugal. Haveria como ter uma experiência religiosa em um show?
Em Lisboa, a porta da igreja possuía o símbolo dos templários talhado na portada, a cruz das navegações, o símbolo da chama violeta, uma cruz que historicamente une ambos os países. Em 1981, na arena carioca decidira dar início e forma à minha carreira musical. Em Portugal em 1996 já começava a pensar em transformá-la em algo mais importante, mais profundo, mais significativo. Pareciam elos da mesma corrente, lados opostos da mesma moeda, portais dimensionais com aberturas físicas em países diferentes e assemelhados. Ciclos que nascem e morrem em si mesmos.
Após descermos do Morro da Urca, fui à casa do amigo jantar, conversar com a sua esposa e brincar com a filha do casal. O apartamento no bairro do Catete se localiza em frente ao Palácio do mesmo nome, antiga sede do governo brasileiro até a transferência para Brasília, o mesmo local onde tantos dos meus “ídolos” governaram (preciso explicar que sou apaixonado por história brasileira), Da sala do amigo, dava para ver as estátuas das Águias no alto do Palácio. Na janela da sala havia aquele bebedor com açúcar que os beija-flores gostam e eles surgiam um após o outro. Houve uma hora que fiquei encantado com uma cena: em primeiro plano um beija-flor sugando agüinha com açúcar, as águias do palácio atrás e no alto um avião saindo do aeroporto Santos Dumont, voando por trás em um imenso céu azul. Foi um acontecimento lúdico e intensamente bonito. Nem sempre os insights e sincronicidades agem assim, com poesia, às vezes atuam como um tapa, pintando um retrato do que se passa no seu interior, melhor ou pior, mas sempre significativo. Quando fatos, aparentemente tão pequenos e para alguns tão bobos, se conectam e se “coincidem” e te dizem algo profundo que não pode ser dito em palavras limitadoras, você acabou de conectar o interno e o externo, como o apertar do botão de uma máquina fotográfica, que eterniza uma cena.
Três dias após a visita à Urca e os beija-flores, em uma quarta, faleceu o crítico musical Ezequiel Neves, que tanto li na juventude e que mais tarde, seria a minha inspiração para escrever sobre o mesmo tema, seguindo-lhe os passos, para também, refletir sobre música. O mais estranho é que Ezequiel morreu exatamente no mesmo dia em que o seu discípulo e cantor Cazuza havia falecido, vinte anos antes, no mesmo 7 de julho.
Juntos, Neves e Cazuza compuseram “Codinome BEIJA FLOR”.